A educação pública brasileira vive um daqueles momentos em que o discurso parece mais bonito que a prática.
O Congresso aprovou o Sistema Nacional de Educação (SNE), apresentado como a solução para décadas de desigualdade, fragmentação e desorganização entre União, estados e municípios.
Mas a pergunta que fica é: o SNE será um divisor de águas ou apenas mais um decreto que dormirá nas gavetas da burocracia brasileira?
A promessa da integração 
O novo sistema nasce com uma ideia poderosa: criar um regime de colaboração real entre os entes federativos.
Na prática, isso significa que políticas públicas, metas e recursos deverão ser articulados e planejados de forma conjunta.
Pela primeira vez, a gestão da educação pública poderá funcionar como um corpo único — e não como um arquipélago de redes isoladas, cada uma lutando com seus próprios desafios.
Parece o ideal, certo?
Mas a educação brasileira já coleciona ideais bonitos e planos inacabados.
 O financiamento como ponto de virada 
O SNE fala em distribuição de recursos com base na equidade e na garantia de padrões mínimos de qualidade.
Isso, se sair do papel, pode corrigir um dos maiores crimes silenciosos do país: a desigualdade brutal entre escolas públicas.
Enquanto uma escola urbana pode ter biblioteca, laboratório e acessibilidade, outra — no interior — luta por giz, ventilador e professores.
O problema é que o texto não cria novos recursos.
Depende de vontade política e de um compromisso real da União em financiar as redes mais frágeis.
Sem dinheiro, a equidade continuará sendo uma palavra bonita em relatórios oficiais.
 Dados, comissões e promessas 
O SNE também prevê uma Infraestrutura Nacional de Dados da Educação (INDE), que reunirá informações de todas as redes e sistemas.
É uma medida técnica e necessária.
Mas já vimos isso antes: sistemas de dados que viram labirintos burocráticos, onde a informação serve mais para relatórios do que para transformação.
O risco é a educação virar um conjunto de planilhas bem organizadas — e escolas desorganizadas.
 O impacto na vida real da escola 
Se tudo funcionar, a mudança pode ser profunda:
Diretores terão acesso a planejamentos e metas nacionais integradas; Professores poderão participar de formações continuadas coordenadas entre União e redes locais; Alunos das regiões mais pobres poderão se beneficiar de critérios de redistribuição mais justos; Secretarias terão apoio técnico nacional, e a comunidade escolar mais voz nos processos. 
Mas é importante lembrar: sistemas não mudam pessoas — pessoas comprometidas é que mudam sistemas.
 O perigo da centralização e da inércia 
Há também o risco do SNE se tornar um novo MEC gigante, tentando ditar políticas de cima para baixo, sem ouvir as realidades locais.
O equilíbrio entre coordenação nacional e autonomia local será a chave do sucesso ou do fracasso dessa política.
E, claro, o velho inimigo da educação pública continua à espreita: a falta de prioridade política.
O SNE não sobreviverá a governos que tratam a educação como gasto e não como investimento.
 O que realmente pode mudar 
O Sistema Nacional de Educação pode — sim — ser um marco histórico, desde que não repita a velha história brasileira: grandes leis, pequenos resultados.
A mudança real virá quando o sistema se traduzir em salas de aula mais dignas, professores valorizados e políticas sustentadas por dados e não por ideologia.
Enquanto isso, seguimos atentos.
Porque o que o Brasil precisa não é de mais um sistema — e sim de um compromisso inadiável com a justiça educacional.
“Nenhum sistema é nacional se deixar para trás quem mais precisa dele.” 

 
 
 
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